quarta-feira, 18 de março de 2009


quinta-feira, 18 de dezembro de 2008




Diário de uma tentativa (preparação para performance do congresso - 6 de outubro de 2008)

O coração batia forte...medo...

Mas decidi: azar, agora vou me entregar...

fechei os olhos e foi...

O mergulho era fundo, de ritmo grave e profundo, como uma escuridão tão imersa - tão imensa - que não havia pra onde olhar... não havia nenhum gesto mais arisco que pudesse contrapor aquele pulso lento e letal que se impunha.


Não dava pra saber o que se passava lá fora - talvez nada, talvez tudo, talvez o mundo e um bocado de coisas que nem conseguia prever. Só previa o estranhamento, previa o embaraço, a vergonha, o desconforto constante de ver aquele enorme corpo se contorcer, e se desamparar, num ridículo temor do mundo.



Um corpo temeroso é muito mais sutil do que um corpo amedrontado, que
treme, e se contorce como um bizarro organismo que vislumbra o terror - o
pânico.

Não queria ser eu o mensageiro profano que faria com que o mal-estar reinasse perante os corpos.

Não queria ser eu o corvo pestilento do agouro - o tédio na balada - a chuva do domingo de ouro.


Jamais eu admitiria meu verdadeiro gozo com um compromisso cancelado, com a reunião desmarcada, com o encontro adiado... "a apresentação não irá ocorrer pois não temos público na platéia..."


AH...a graciosa inércia que acalma as excitações medrosas, que evitam o olhar, que contraem os ombros, e apertam os dedos dos pés.

Essa coisa pestilenta, não pude deixar de mostrar-lhes, não pude esconder de seus sensos atentos. Estava ali, quase nu, quase em nádegas, e sem mais nenhuma chance de voltar atrás,

como o primeiro instante, logo que se pula, e se perde o chão...agora é só a queda!


Me perdi...e fiquei estacado numa roupa justa de pura tensão, uma certa agonia que em seguida iria afrouxar, eu sabia... porém, toca o celular, e o seu toque é uma buzina persistente, e resistente a meus sons internos.

Por isso busquei um volume máximo, e no ápice do que seria minha nota mais alta, sustentei... lutei, mano a mano com aquilo, sabendo que tinha mais força prá superá-lo, tinha que sustentar até que parasse, e ele não parava, e eu ali, tentando...

imaginei minha morte, ou um desconforto qualquer, como aquela infinita sensação de que a dor não vai passar ...


mas de repente passou...silenciou...e expressou o rebote de algo que o silêncio, de novo, me entregou...


Com isso busquei me conduzir como calor - grau a grau, grão a grão, sol a sol...e isto sempre me foi o mais duro, perseverar gota a gota - meus goles são largos, e de tudo tenho (e quero) demais. Excessos inevitáveis de um corpo que nunca se satisfaz. Uma busca amarga que a fome faz continuar.


Por tudo isso, me trouxe de volta , e alguns segundos antes de abrir os olhos, sabia que não conseguiria enxergar o que quer que estivesse lá... eu estava mirado, tinha uma miragem, uma vertigem encarnada, e não havia ninguém comigo.


Sinto a luz arranhando meus olhos, e vejos as cores de tudo e de todos, seus olhos parados, e retidos , calados, e eu ali, me desmancho de embaraço.


Tento ser corajoso, olhos-os de cara, com minhas vergonhas na cara, e todo mundo cala, e logo fala, da angustia, da dor, da morte, matar a si, matar-se em vida.


Como eu fui me deixar tomar, me deixar entregar para um santo feroz, um santo obscuro e ferino, com alma de punhal e gosto de sangue nos olhos.


Eu era este monstro, sofria seus ataques, e contra-atacava com gritos mudos de agonia e gozo, gozo de buscar a entrega, mesmo que nas mãos deste carrasco louco (que me embala há anos).


As mãos duras e frias daquela sensação me fizeram ficar mais assustado, mais rechaçado, mais envergonhado diante de tudo o que emano.


Não tenho como esconder, nem a mim, nem a ninguém, só me resta me atirar na calçada, de frente para o sol, e mijar...mijar pra que todo mundo veja o brilho dourado do jato contra a luz, e o aroma ácido e pútrido que carregamos em esconderijos.

Meu prazer de abrir feridas, arrancar os pontos, e querer fazer sangrar já não me orgulha tanto, me sinto um cadáver desesperado, tentando não me sentir morto.

Me sinto um assassino delicado, que acaricia seu próprio pescoço.

Tenho medos de meus diabos, e eles tanto orgulho...

mas o que me desfaz por inteiro, é perceber que todos olham, já sabem, e se paralisam diante deste palhaço tristonho, que quer ser amado, mas não sabe como.